Nota zero
As formas equivocadas com que palavras simples são escritas pelos nossos alunos da Universidade motivam, em muitos momentos, situações hilárias. Individualizar ou personificar a responsabilidade pelo problema vem sendo, com recorrência, a alternativa política mais apropriada para justificar o precário rendimento que nossos alunos revelam na universidade. A mídia alardeia, com tons de comédia grotesca, os estapafúrdios que pululam de testes de avaliação como vestibulares e similares, levando ao palco do humor e do deboche um cenário que, pelo dantesco de sua configuração, expõe as mazelas de um quadro educacional caótico e desgovernado.
A dimensão real da questão revela um contexto social, político e cultural preocupante e que, historicamente, vem se arrastando e se agudizando na proporção em que os investimentos públicos no campo da educação não são efetivados na mesma intensidade das demandas da população. Quando entidades ligadas ao setor educacional e movimentos sociais reclamam um teto de dez por cento do produto interno bruto para investimento anual na educação pública não quer levantar bandeiras de oposição a governos ou partidos políticos que, momentaneamente, controlem o poder. A preocupação que move essa reivindicação é a constatação de quem, no cotidiano das salas de aula, se depara com a precariedade do sistema público de educação no país.
Milhares de escolas espalhadas por esse país, sobretudo, nas fases iniciais do ensino, funcionam na precariedade material de carteiras quebradas, tetos com goteiras, banheiros interditados, merenda escolar ausente por meses, uma biblioteca que se resume a uma estante com alguns livros discretamente colocada em um canto de sala, ausência de espaços para a prática desportiva e para o lazer, inexistência de laboratórios, equipamentos de informática que se tornam obsoletos nas caixas por falta de uma simples rede elétrica compatível. Sem falar nos salários dos professores que, em muitos municípios, sofrem os humores e horrores dos fluxos eleitorais e administrativos, que negam salários, mínguam vencimentos, impedem a qualificação docente e, sobretudo, empurra os professores para o desgastante exercício do duplo ou triplo vínculo como alternativa mínima de sobrevivência.
Os efeitos dessa caótica situação ressoam na universidade quando nossos alunos, oriundos deste sistema de ensino, revelam enormes dificuldades em compreender um texto, em articular uma reflexão crítica, em elaborar uma formulação conceitual sobre determinada questão. E, coroando esse quadro, os erros e equívocos que, no cotidiano, nos aterroriza quando constatamos escritas do tipo: cáuculo, alcanse, xances, benefícil, almenta, expressam uma urgência em redirecionar a política educacional e os investimentos públicos para este campo. Não basta ampliar as vagas nas universidades e fazer disso alarde promocional. Temos que ensinar a pensar e a refletir sobre nossa realidade. E essa tarefa cabe a escola em qualquer grau. E como fazemos isso se não temos sequer o tempo para ler e pesquisar porque outra jornada nos chama. Nota zero. Com louvor.
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